domingo, 6 de julho de 2025

Na encruzilhada do mundo: Reexistência como forma de futuro

Por Antônio Gomes Barbosa, sociólogo.

“Não somos resistentes. Somos reexistentes.” 

A afirmação de Nêgo Bispo, pensador quilombola do Piauí, é mais do que uma provocação política — é uma chave epistemológica. Em vez de reagir às estruturas coloniais com o desejo de inclusão, Bispo propõe a continuidade de mundos que seguem vivos apesar da colonização. Em cada roda de conversa em uma farinhada, em cada mutirão de roçado, nas trocas entre parteiras, raizeiras e agricultores experimentadores, algo se move fora do mapa: são práticas ancestrais que sustentam mundos inteiros. E entre esses mundos, o pensamento de Bispo se ergue como uma teoria viva — uma teoria de mato, de encruzilhada e de autonomia. Sua obra não pede passagem: finca território.

Ao longo de décadas, Antonio Bispo dos Santos elaborou categorias próprias, como “contra-colonização”, “transfluência”, “confluência de saberes” e “cosmofobia”, que hoje atravessam debates acadêmicos. Em Colonização, Quilombos: modos e significados (2015), ele denuncia a renovação das formas de dominação, afirmando que a colonização apenas trocou de roupa: agora se apresenta como projeto, ONG, universidade ou lei. Sua crítica não busca apenas desmascarar estruturas de poder, mas afirmar a legitimidade de mundos que existem sem autorização. Ele chama de contra-colonização essa reação criadora dos territórios, que não é mera resistência, mas reinvenção dos próprios caminhos e cosmologias. Sua leitura de mundo se aproxima, em sentido conceitual, da ideia de autopoiese — não como termo assumido ou reelaborado por ele, mas como uma descrição possível da lógica que reivindica: a capacidade que os povos do território têm de produzir e sustentar suas formas de vida, seus modos de saber e suas práticas sociais sem a necessidade de mediação externa. Essa aproximação conceitual ajuda a iluminar a potência política do que Bispo propõe, sem forçar sobre ele um vocabulário que não reivindica.

Para Bispo, a convivência com o Semiárido não é uma política adaptativa nem um programa técnico. É uma forma de mundo. Não se trata de fazer os pobres sobreviverem às agruras do clima, mas de reconhecer que há formas de existência que florescem no calor da Caatinga, ritmadas por outros tempos, outros corpos e outras cosmologias. “Convivência não é adaptação. É autonomia”, afirmou em uma de suas falas públicas. Essa concepção recusa o modelo de integração oferecido pelo Estado e pelas instituições formais, insistindo na dignidade de continuar existindo a partir de si.

Essa perspectiva encontra ressonância na obra de Maria Sueli Rodrigues de Sousa, jurista, socióloga e professora piauiense, cuja trajetória foi marcada pela construção de um Direito enraizado na escuta, na ancestralidade e no compromisso com os povos do campo, das águas e das florestas. Em sua atuação intelectual e política, Sueli desenvolveu a pedagogia da ancestralidade como prática viva de resistência e reexistência, que desafia os modelos coloniais de saber e de tempo. Para ela, a ancestralidade não é um passado encerrado, mas uma presença orientadora que se manifesta nos gestos cotidianos de cuidado, escuta e lentidão — fundamentos de uma política enraizada nos ritmos da vida e não na produtividade compulsiva. Em suas falas públicas e textos acadêmicos, defendia que o saber ancestral, longe de ser residual, constitui-se como método para descolonizar o conhecimento, o ensino e o próprio Direito.

Ambos os autores — em campos distintos, mas enraizados na mesma terra — convergem ao tratar da convivência como insurgência epistêmica. Trata-se de recusar a tradução forçada dos saberes do território para os moldes institucionais. Bispo alerta que converter as práticas quilombolas em políticas padronizadas é uma forma de apagamento. É o que ele chama de “tradução para poder dominar”. Sua metáfora mais recorrente, a encruzilhada, não é mero ornamento poético: é conceito estruturante. “Na encruzilhada, todo mundo passa. Mas nem todo mundo para. E só quem para aprende alguma coisa com ela”, diz. Nela, os saberes não se fundem nem se anulam. Convivem em tensão, como os fios trançados de uma rede viva que não aceita hierarquia.

Essa visão da continuidade dos mundos encontra forma concreta na maneira como Bispo concebe o tempo e a transmissão de saberes. Em uma de suas falas mais marcantes, ele propõe uma ruptura com a lógica linear da modernidade — aquela que organiza a vida em começo, meio e fim — e a substitui por uma circularidade vital: “geração vó, geração mãe, geração neta: começo, meio, começo”. Nesse ciclo, o tempo não se encerra: ele se renova. A geração da avó carrega o início e a memória, a mãe sustenta o presente com suas escolhas e saberes, e a neta não representa o futuro, mas o reinício. Trata-se de um tempo encarnado, em que a oralidade, a escuta e a prática caminham juntas. Essa forma de ver o mundo não apenas recusa a ideia de progresso linear, mas afirma outra lógica temporal, profundamente enraizada na terra, nas relações e nos corpos que a habitam. Ao invés de destino, a história vira travessia. Ao invés de fim, recomeço.

A radicalidade dessa postura ecoa a epistemologia ch’ixi de Silvia Rivera Cusicanqui, que propõe uma convivência fraturada entre saberes sem síntese nem absorção, e as críticas de Leanne Simpson à domesticação dos conhecimentos indígenas. Contra esse modelo dominante de integração, Bispo propõe o respeito àquilo que persiste. Não como resistência romântica, mas como prática de continuidade. Por isso, sua ciência é do mato: é feita com os calos dos pés, com os olhos que leem o tempo das árvores e os ouvidos afinados com o som do chão. Parteiras, raizeiras, agricultores e griôs não repetem tradições mortas — cultivam uma ciência viva, que cuida, organiza e regenera o mundo.

Maria Sueli reforça esse caminho ao valorizar a escuta como gesto central de sua pedagogia da ancestralidade, entendida não como repetição do passado, mas como reorientação do presente a partir da presença dos que vieram antes. Em suas intervenções públicas e trabalhos acadêmicos, ela destacava que os corpos, os tempos e os territórios guardam saberes profundos, muitas vezes invisibilizados pelas lógicas institucionais e diagnósticos técnicos. Para Sueli, a ancestralidade não requer validação externa: ela se afirma por sua capacidade de sustentar a vida e regenerar o mundo. Essa visão converge com a de Nêgo Bispo, ao recusar a domesticação dos saberes populares e afirmar sua legitimidade plena — não por serem reconhecidos pela academia ou pelo Estado, mas porque seguem vivos, porque nunca cessaram.

Essa recusa à integração — também presente no pensamento de Arturo Escobar e em sua política da autonomia e do sentipensar com a Terra — ganha, em Bispo, uma forma encarnada no cotidiano dos territórios quilombolas. Não se trata de entrar no sistema, mas de interromper as expulsões. A convivência, para ele, não é um objetivo a alcançar. É o que já existe no passo lento de quem planta, no gesto ancestral de quem partilha, no cuidado de quem escuta sem traduzir. Reexistir, nesse sentido, é continuar produzindo mundos nos próprios termos, mesmo quando tudo ao redor exige adaptação, assimilação ou silêncio.

Em uma de suas falas mais citadas, Nêgo Bispo afirma: “Não estamos lutando por um mundo novo. Estamos cuidando para que o nosso mundo não desapareça.” A frase não se quer épica. Ela é raiz. E talvez por isso incomode tanto: porque exige mais do que política pública. Exige escuta. Exige coragem para parar na encruzilhada e não atropelar o que ali pulsa. Exige descolonizar o olhar, o tempo e o gesto. Seu maior ensinamento talvez seja este: não existe um único caminho. Existe a dignidade de caminhar com os pés no chão — e a sabedoria de saber onde não se deve pisar.

Nêgo Bispo e Maria Sueli Rodrigues, cada um a seu modo, anunciam que a luta não é por um lugar no mundo dominante. É por um outro modo de mundo. Um mundo que não precisa ser inventado — porque já existe, inteiro, na oralidade, na sabedoria do mato, na escuta da ancestralidade e na firme decisão de continuar existindo com dignidade.

Salve, salve!

Sueli e Nêgo Bispo, obrigado!

A ordem é desobedecer: Sueli Rodrigues e os sujeitos desconstitucionalizados

Por Antônio Gomes Barbosa, sociólogo

Maria Sueli Rodrigues de Sousa, jurista, socióloga e pensadora piauiense, construiu um dos aportes mais singulares do constitucionalismo crítico brasileiro contemporâneo. Sua trajetória não foi apenas acadêmica: foi também vivida, partilhada e forjada no chão do sertão do Piauí, entre comunidades tradicionais, territórios camponeses, escolas e movimentos sociais. Sua obra se articula por uma epistemologia da convivência, em que o direito se constitui a partir das experiências populares, das memórias compartilhadas e dos afetos politicamente organizados.

Sueli cunhou a expressão “sujeitos desconstitucionalizados” para expressar uma contradição fundante da ordem jurídica brasileira: a distância entre o texto constitucional — inclusivo e formalmente democrático — e a persistente exclusão de povos e comunidades que, mesmo reconhecidos em normas, seguem desprovidos de direitos efetivos. Em Vivências constituintes: sujeitos desconstitucionalizados (2021), propõe que a Constituição não é apenas letra escrita, mas um campo de disputas simbólicas e materiais em que sujeitos historicamente marginalizados — negras e negros, indígenas, camponesas, ribeirinhos, quilombolas, populações periféricas — são impedidos de constituir-se politicamente como sujeitos plenos.

Sua crítica se desdobra na proposição de uma reconfiguração do constitucionalismo, a partir do que chama de “vivências constituintes”: experiências cotidianas e práticas normativas autônomas que tensionam, reescrevem e fundam outros modos de existir e legislar. Não se trata de uma recusa ao direito, mas de uma recusa ao monopólio epistemológico que o Estado exerce sobre o que é reconhecido como direito. Como ela afirmou em entrevista: “a ordem é desobedecer os marcos da cultura eurocêntrica” — uma frase que se tornou emblema de sua desobediência epistêmica, entendida como gesto de ruptura com os sistemas de verdade que separam saberes válidos de saberes ilegítimos.

Em sua dissertação de mestrado, Imaginário social de semiárido e o processo de construção de saberes ambientais (2005), Sueli analisa os modos de saber das comunidades camponesas do Piauí sobre o clima, o solo, as chuvas e o cultivo da terra. Revela como o conhecimento ambiental ali produzido se enraíza em experiências vividas, narrativas orais, religiosidades e práticas herdadas — e denuncia o extrativismo cognitivo e o tecnicismo jurídico que tentam invalidar tais saberes em nome de uma racionalidade supostamente neutra. A produção do conhecimento, segundo ela, é parte da luta por reconhecimento e dignidade. Em suas palavras: “toda vida produz conhecimento. O problema é que só algumas vidas são reconhecidas como produtoras de saberes”.

A tese de doutorado, defendida na Universidade de Brasília em 2009, aprofunda e radicaliza esse percurso. Em O povo do Zabelê e o Parque Nacional da Serra da Capivara no Estado do Piauí: tensões, desafios e riscos da gestão principiológica da complexidade constitucional, Sueli denuncia a violência institucional produzida por uma política ambiental que, ao invocar princípios constitucionais e normas internacionais, desaloja, invisibiliza e deslegitima os modos de vida tradicionais. A comunidade do Zabelê, localizada nos arredores do Parque Nacional da Serra da Capivara, é tomada como caso emblemático da contradição entre conservação ambiental e permanência comunitária.

Na tese, Sueli propõe uma crítica à “gestão principiológica da complexidade constitucional”, ou seja, à aplicação de princípios jurídicos abstratos — como a proteção ambiental ou a função social da terra — de maneira descolada das realidades vividas. Para ela, essa aplicação desconsidera a complexidade dos territórios, das relações simbólicas e da historicidade dos povos. Sua defesa é por um direito que se forme a partir do que ela chama de “direito fenomenológico e territorializado”, fundado nas experiências, nos corpos, nos ritmos e nas memórias das comunidades.

O campo epistemológico proposto por Sueli se entrelaça com o de pensadores como Walter Mignolo, Silvia Rivera Cusicanqui e Catherine Walsh, mas é profundamente ancorado nas realidades brasileiras. Há, contudo, uma afinidade conceitual e afetiva ainda mais intensa com o pensamento de Nêgo Bispo, quilombola do Piauí, com quem Sueli compartilhou espaços de militância, formulação e reencantamento do território. Enquanto Sueli propõe as “vivências constituintes” como práticas fundantes de um novo constitucionalismo, Bispo fala em “ciência do mato”, “transfluência” e “epistemologias da encruzilhada” — todas formas de desestabilizar a hierarquia entre saberes e de afirmar que o conhecimento legítimo não nasce no centro, mas nas bordas, nas encruzilhadas, nos territórios de reexistência.

Ambos afirmam que a oralidade, a memória, a experiência coletiva e o pertencimento territorial não são obstáculos à produção de direito: são, ao contrário, suas condições mais legítimas. Ao lado de Bispo, Sueli constrói o que podemos chamar de uma epistemologia da convivência, marcada pela desobediência amorosa, pela insurgência afetiva e pela recusa em aceitar que o Estado e suas instituições sejam os únicos mediadores da legalidade e da existência.

No ensaio “Quem precisa de identidade? Eu preciso”, Sueli revisita sua própria trajetória. Narra que, enquanto vivia no Saco da Ema, não precisava de identidade individualizada: “eu era da minha comunidade”. Foi ao migrar para espaços urbanos que lhe foi exigido o documento, o CPF, a comprovação institucional de sua existência. Mas essa exigência, segundo ela, destitui a pessoa de sua forma de pertencimento original e impõe um modelo de cidadania que é, ao mesmo tempo, regulador e excludente. Sueli escreve: “o direito estatal é um, mas você conduz a sua vida com o direito que não necessariamente é o estatal... você faz parte da sua comunidade”.

Esse olhar se materializa em diversas falas públicas. Em um vídeo de 2022, Sueli afirma: “Eu sou contra o desenvolvimento, eu sou contra o progresso”. Essa recusa não é irracional ou romântica: é uma crítica profunda à colonialidade do desenvolvimento, que transforma modos de vida em “atraso” e comunidades tradicionais em obstáculos. Em vez disso, Sueli propõe formas de convivência com a terra, com os saberes, com os tempos e com os territórios, que rompem com o imperativo produtivista da modernidade.

Sua contribuição para o direito brasileiro é, assim, ao mesmo tempo teórica, política e afetiva. É teórica, porque propõe categorias novas para pensar o constitucionalismo — como sujeitos desconstitucionalizados, vivências constituintes e direito fenomenológico. É política, porque insere esses debates no contexto das lutas por terra, água, memória e autonomia dos povos. E é afetiva, porque afirma que o direito não pode ser apenas técnica ou norma, mas precisa ser relação, cuidado, partilha.

Em tempos de retrocesso institucional, criminalização de saberes ancestrais e repressão aos territórios populares, a obra de Sueli Rodrigues ressoa com ainda mais urgência. Sua frase — “a ordem é desobedecer” — não é apenas uma provocação. É um chamado à construção de outro mundo: mais justo, mais sensível e mais plural. Um mundo onde o direito seja também palavra viva.

Sob o título “Água para colher futuro”, MDS lança livro para registrar conquistas e desafios dos 20 anos do Programa Cisternas

Lançamento, durante o X EnconASA, teve como palco as margens do Rio São Francisco, paisagem inspiradora da região do Semiárido

“Cada cisterna conta uma história”, afirma o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no texto de abertura do livro recém-lançado pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), em alusão aos 20 anos do Programa Cisternas. Representando as mais de 1,3 milhão de histórias de famílias atendidas com a tecnologia social de acesso à água nesse período, a publicação reúne relatos de um grupo de pessoas – gestoras e gestores públicos, pesquisadores, dirigentes de organizações sociais, entre outros – que ajudaram a construir essa importante política pública de garantia do direito de acesso à água e ao alimento.

“Ao abordar os desafios e conquistas do Programa Cisternas, esta publicação propõe uma reflexão sobre o nosso papel, como sociedade, na defesa dos direitos básicos e na promoção da justiça social”, afirma o ministro Wellington Dias, no prefácio do livro.

Ao longo de suas mais de duzentas páginas, o livro traz artigos que abordam temas transversais e profundamente convergentes ao Programa Cisternas, como segurança alimentar, transformação social, relação entre Estado e sociedade, inclusão social, mudanças climáticas, entre outros. Traz ainda um relato de como surgiu essa que é, hoje, uma das mais importantes políticas públicas de convivência com o Semiárido e que, de forma inovadora surge como um instrumento de resiliência para as populações rurais no Brasil, frente aos desafios das mudanças climáticas.

A secretária nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do MDS, Lilian Rahal, destacou que o nome do livro "Água para colher futuro" é sugestivo, porque a trajetória construída até aqui é só a metade do caminho. "Ainda temos um longo caminho pela frente e um futuro para explorar e trabalhar para garantir a segurança alimentar e a segurança hídrica das populações rurais.”

A linha do tempo, cuidadosamente elaborada com a colaboração de diversas pessoas que ajudaram a construí-la desde o início da implementação do Programa, não encerra no capítulo dedicado a ela. Segue sendo escrita para além das páginas impressas, no dia a dia de um processo de gestão norteados pelos princípios da democracia participativa, que envolve parcerias entre Governo Federal, governos estaduais e sociedade, por meio de suas organizações.

“O artigo de contribuição da ASA tem um elemento importante que é a perspectiva de reconhecer que existe uma coprodução da política pública. O Programa Cisternas pode até ser uma sugestão e uma contribuição da sociedade civil, mas ele não seria possível sem a parceria com o Estado, sem a parceria com pessoas que acreditam e confiam nessa ação. Essa retomada reafirma a necessidade da parceria entre a sociedade civil e o Estado. E nós, da ASA, temos o prazer e a honra dessa parceria”, afirmou o coordenador pedagógico da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Antônio Barbosa.

Recheado de histórias inspiradoras, relatadas por homens e mulheres que hoje experimentam uma nova realidade, graças ao direito de acesso à água a eles assegurado pelo Programa Cisternas, o livro ainda traz um capítulo dedicado a dados e pesquisas realizadas. Um exercício de sistematização que tem como intuito trazer evidências sobre o processo de transformação e melhoria da vida das pessoas, hoje não apenas na região do Semiárido, mas também em outras regiões do país, como a Amazônica.

“O livro traz a revolução silenciosa que está acontecendo também na Amazônia e o que significa essa tecnologia social que a ASA desenvolveu lá no início e vem implementando ao longo desses muitos anos, o que significa isso para as políticas públicas e onde a gente quer chegar”, registrou Lilian Rahal.

A reflexão feita logo nas primeiras linhas do capítulo introdutório destaca a importância do Programa desde a sua origem, há mais de duas décadas, até o presente e para o futuro: “Beber água suja, empoçada, compartilhada com os animais é uma experiência aviltante pela qual passam ainda muitos brasileiros e brasileiras rurais pobres. Ter água de qualidade em casa é outra vida. Ouvir as famílias que participam do Programa Cisternas falarem dessa mudança é sempre comovente”

Foto: ASA
Foto: ASA
Paisagem e lançamento

Com 2.863 km de extensão, o “Velho Chico”, como é carinhosamente chamado o Rio São Francisco, é parte da vida de todo sertanejo. A imensidão de suas águas parece nutrir a esperança que renasce todos os dias no coração de quem vive no Semiárido e que aprendeu com a situação de escassez desse tesouro natural na região que água é direito de toda pessoa.

Nesse cenário, no município de Piranhas, em Alagoas, foi realizado o lançamento do livro “Águas para Colher Futuro - 20 Anos do Programa Cisternas”, durante o X Encontro Nacional da Articulação Semiárido Brasileiro (EnconASA).

Para Vitor Santana, coordenador-geral de Acesso à Água da Secretaria Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sesan) do MDS, “o livro é uma forma de deixar o registro dessa revolução silenciosa e transformadora, não só a cisterna mas esse movimento que a ASA representa para a região do Semiárido.”

Nessa mesma sintonia, Fernanda Cruz, coordenadora de Comunicação da ASA, ressaltou que “o livro permite que essa história permaneça, que não seja esquecida, tanto para quem está em outros lugares quanto para futuras gerações. Isso também é um grande legado desses 25 anos de ASA e também, por conta dessa relação que a gente construiu ao longo dos anos com o governo”, concluiu.

A realização do projeto que culminou na publicação, já está disponível a todas as pessoas na versão eletrônica e na série de vídeos de famílias beneficiárias, também disponível no YouTube, é resultado de uma parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Somam-se a esse esforço, o trabalho e a dedicação de inúmeras pessoas, organizações da sociedade civil parceiras e equipes que contribuíram para alcançar o resultado apresentado.

Assessoria de Comunicação - MDS

Assistência Social

domingo, 15 de junho de 2025

CONTAG: Seis Décadas de Lutas no Campo Brasileiro História, Conquistas e Resistências

 Antônio Gomes Barbosa*

Alexandre Ribeiro Botelho - Merrem**

Resumo

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) tem sido, desde sua fundação em 1963, uma das mais importantes organizações de representação e organização dos trabalhadores e trabalhadoras do campo brasileiro. Este artigo reconstitui sua trajetória histórica, articulando os ciclos políticos nacionais com os processos de auto-organização rural, a institucionalização dos direitos sociais, as disputas em torno das políticas agrárias e de convivência com o Semiárido e de fomento da produção e comercialização para o fortalecimento da agricultura familiar. A análise percorre seis períodos: (1) fundação e resistência à ditadura; (2) rearticulação democrática e Constituinte; (3) consolidação da reforma agrária e da política sindical; (4) expansão das políticas de convivência com o Semiárido; (5) defensiva institucional e riscos recentes; (6) retomada democrática e novos desafios. Em cada etapa, são destacadas ações relevantes, lideranças, campanhas, articulações institucionais e os enfrentamentos com os projetos hegemônicos de desenvolvimento rural.

Quadro 1 – Principais Períodos da História da CONTAG

Período

Características principais

Governo federal

1963–1964

Fundação, mobilização pré-golpe

João Goulart

1964–1985

Intervenção, resistência e reorganização sindical

Ditadura militar

1985–1994

Redemocratização, Constituinte e reconhecimento de direitos sociais

Sarney, Collor, Itamar Franco

1995–2015

Políticas públicas, reforma agrária, programas de convivência

FHC, Lula, Dilma

2016–2022

Golpe, retrocessos institucionais, desmonte das políticas públicas

Temer, Bolsonaro

2023–2025

Retomada democrática, reconstrução institucional, novos desafios

Lula (3º mandato)

 1. A CONTAG entre a fundação e o golpe (1963–1964)

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) foi criada em 22 de dezembro de 1963, no contexto das reformas de base propostas pelo governo João Goulart. Sua fundação resultou de um processo de mobilização iniciado nos anos 1950 com o surgimento de associações de trabalhadores rurais, influenciadas por experiências anteriores como as Ligas Camponesas de Francisco Julião em Pernambuco e a atuação da Igreja Católica por meio da Juventude Agrária Católica (JAC). A criação da CONTAG foi um marco no processo de sindicalização do campo, pois estabeleceu uma representação nacional autônoma dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, num momento de intensificação das lutas pela reforma agrária.

Segundo Gohn (2011, p. 129), “o sindicalismo rural surgiu no Brasil em meio a uma estrutura agrária concentradora, buscando reconhecimento institucional e político para os camponeses e assalariados do campo”. A CONTAG nasceu, portanto, como um projeto de organização e resistência, voltado à construção de uma cidadania camponesa num país ainda marcado por latifúndios, coronelismo e repressão.

Contudo, poucos meses após sua fundação, o golpe civil-militar de 1964 interrompeu violentamente esse processo. A recém-criada Confederação sofreu intervenção federal, e dezenas de lideranças sindicais foram perseguidas, presas ou exiladas. A estrutura sindical do campo foi submetida ao controle do Ministério do Trabalho, que nomeava interventores nas federações e sindicatos. O projeto de reforma agrária foi abandonado, e o sindicalismo rural foi instrumentalizado pelo regime para fins de pacificação social.

2. Resistência e rearticulação durante a ditadura (1964–1985)

Durante os 21 anos da ditadura militar, a CONTAG passou por um processo de resistência silenciosa e reorganização institucional, ainda que sob forte controle estatal. Apesar das intervenções, a Confederação manteve atividades formais, utilizando os canais permitidos pela legislação sindical para manter ativa a representação dos trabalhadores. Com o tempo, lideranças camponesas começaram a reocupar espaços nos sindicatos de base e nas federações estaduais.

A partir da década de 1970, com o crescimento da oposição ao regime e a atuação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), formou-se uma aliança estratégica entre o movimento sindical e os setores progressistas da Igreja Católica. Essa articulação foi fundamental para a formação de novas lideranças e para a retomada das pautas de direitos e reforma agrária. Segundo Navarro (2003, p. 44), “a construção da nova hegemonia camponesa passou pela articulação entre cultura popular, teologia da libertação e práticas sindicais de base”.

Um marco importante foi a organização das FETAGs – Federações dos Trabalhadores na Agricultura – em vários estados, como a FETAPE e a FETAG-RS, que passaram a atuar com maior autonomia e foco formativo. Em paralelo, a CONTAG começou a sistematizar experiências de formação e a construir sua base de dados sobre a realidade rural, preparando-se para o contexto da redemocratização.

Como afirma Fernandes (2013), o sindicalismo camponês do período ditatorial “foi se politizando na contramão do Estado autoritário, valendo-se de brechas legais e do apoio das pastorais para organizar a luta no interior”. A resistência à ditadura no campo brasileiro, portanto, não foi apenas institucional, mas sobretudo territorial, por fortalecer as articulações locais e regionais; cotidiana, pois esteve presente no dia a dia da luta e resistência contra a ditadura e pedagógica por possibilitar incontáveis espaços formativos cultivando aprendizados frutos de um processo de construção coletivo do conhecimento, que semeavam transformações sociais.

3. Redemocratização, Constituição de 1988 e fortalecimento da representação (1985–1994)

Com o fim do regime militar e o início do processo de redemocratização, a CONTAG ampliou sua atuação política e recuperou espaços institucionais, tornando-se uma das principais protagonistas na defesa dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais. A participação ativa da entidade na Assembleia Nacional Constituinte (1987–1988) foi determinante para a consolidação de direitos previdenciários, trabalhistas e fundiários no campo.

Entre as conquistas emblemáticas do período está a inclusão dos trabalhadores e trabalhadoras rurais no sistema de seguridade social, com a criação da aposentadoria rural, o direito à licença-maternidade e a extensão dos direitos previdenciários a homens e mulheres. Foi também assegurado o acesso à terra como direito social, conforme previsto no artigo 184 da Constituição de 1988. De acordo com Delgado (2012, p. 38), “o protagonismo da CONTAG na Constituinte garantiu que o mundo rural fosse reconhecido como parte integrante da cidadania brasileira”.

Essa fase foi marcada ainda pelo fortalecimento organizativo da base sindical. A fundação da Escola Nacional de Formação da CONTAG (ENFOC) e a ampliação dos programas de formação de lideranças nos sindicatos e federações estaduais permitiram um salto qualitativo na ação sindical. O conceito de formação política e cidadã, que se tornou central na estratégia da entidade, foi influenciado pelas metodologias freirianas e pela experiência das pastorais rurais, como reconhece Silva (2010, p. 116): “a pedagogia do oprimido, trazida por Paulo Freire, foi incorporada pelos agentes da CONTAG como método de mobilização e consciência de classe”.

Nesse mesmo período, a CONTAG intensificou seu diálogo com o Estado e com outras organizações sociais. Acompanhou a criação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Fórum Nacional de Reforma Agrária e do campo progressista que passou a disputar as políticas públicas no governo federal. Em um cenário de crise econômica, hiperinflação e instabilidade política nos governos Sarney, Collor e Itamar Franco, a CONTAG atuou tanto na denúncia das violências no campo quanto na proposição de alternativas institucionais para a agricultura familiar.

4. A CONTAG na era das políticas públicas e da convivência com o Semiárido (1995–2015)

No seu 6º Congresso Nacional de Trabalhadores Rurais, realizado em 1995, a CONTAG inicia um amplo debate acerca da necessidade de formular um Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário – PADRSS, para fazer frente ao projeto concentrador de riquezas e de poder, elitista e hegemônico na sociedade brasileira. Nesse sentido, foram promovidas, em âmbito nacional, estadual, regional e municipal, várias ações de formação, pesquisa e debate, para que fossem elaborados e sistematizados, de forma participativa e democrática, os conteúdos do PADRSS, posteriormente aprovado no 7º Congresso Nacional de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, realizado em 1998. Foram aprovados os pontos centrais do PADRSS, os quais orientaram a prática sindical e a sua ação política pelas décadas seguintes, garantindo unidade de ação e visão estratégica de enfrentamento ao projeto político conservador do agronegócio e das elites brasileiras.

A partir do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1998–2002) e, sobretudo, com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência em 2003, a CONTAG passou a atuar em uma conjuntura mais favorável à formulação de políticas públicas voltadas à agricultura familiar, aos povos do campo e à convivência com o Semiárido. O reconhecimento da agricultura familiar como categoria legal, por meio da criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), marcou o início de um ciclo de expansão de programas específicos, muitos deles com a participação ativa da CONTAG desde a sua concepção e, em várias vezes, nas implementações de projetos inovadores para vida digna no campo, visando a superação da fome e da extrema pobreza.

Cabe destaque também a Marcha das Margaridas, que desde o ano 2000, hoje na sua sétima Edição, vem sendo a maior mobilização da organização de mulheres do Brasil.  Em todas as suas realizações, apresentou um conjunto de reivindicações para que se efetivem políticas públicas de proteção das mulheres contra violência, de democratização do acesso à terra, de agroecologia, de preservação da natureza e de inclusão digital para trabalhadoras rurais. A Marcha da Margaridas, protagonizada pela CONTAG, em parceria com muitos outros movimentos sociais, tornou-se símbolo da resistência de milhares de homens e mulheres que buscam justiça e dignidade. 

Durante os governos Lula e Dilma Rousseff (2003–2015), a CONTAG se consolidou como uma das principais interlocutoras do governo federal na elaboração e monitoramento de políticas rurais. Participou ativamente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CONDRAF), do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e de instâncias interministeriais voltadas à reforma agrária, ao crédito rural e às políticas sociais, para o fortalecimento efetivo da agricultura familiar. Segundo Sauer (2016, p. 55), “a institucionalização do movimento sindical rural no período petista criou as condições para que as demandas históricas da agricultura familiar fossem incorporadas ao orçamento público e às agendas ministeriais”. As manifestações do Grito da Terra Brasil foram potentes expressões nacionais do Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais, realizadas anualmente, para garantir a negociação com os governos federal e estaduais das principais reivindicações do campo brasileiro, em que muitas dessas reivindicações viraram políticas públicas.

O processo formativo, desde a base sindical, até as ações estaduais, regionais e nacionais, implementado pela Escola Nacional de Formação da CONTAG, desde a sua fundação em 2006, se constituiu fundamental ferramenta para a afirmação e defesa do Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário- PDRSS, no cotidiano da vida sindical nas cinco regiões do Brasil.

Destacam-se, nesse ciclo, os seguintes programas:

  • Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC): a atuação da CONTAG foi decisiva para a capilaridade do programa, por meio dos sindicatos e das federações vinculadas presentes no Semiárido. A organização incentivou a ação e a mobilização das famílias para a adesão ao programa, combinando mobilização social com controle popular. Segundo ASA Brasil (2014), os sindicatos rurais tiveram papel crucial na articulação entre as comunidades, as entidades executoras e os órgãos gestores.
  • Campanha Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural: lançada em 2004, essa iniciativa conjunta com o MDA e a Secretaria de Políticas para as Mulheres beneficiou mais de 2 milhões de mulheres com documentação civil, trabalhista e previdenciária. A campanha foi reconhecida internacionalmente como boa prática em políticas de equidade.
  • Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) e Programa Sementes do Semiárido: a CONTAG, com forte protagonismo das federações e sindicatos rurais do Semiárideo, sempre teve em sua pauta de negociação, quer no Grito da Terra Brasil, quer nas Marchas das Margaridas, os programas de acesso à agua e sementes, sendo essencial para que os governos incorporassem a dimensão da convivência com o Semiárido.
  • Projeto Quintais Produtivos das Margaridas: articulado em parceria com a Secretaria de Mulheres da CONTAG, promoveu a soberania alimentar e a valorização do trabalho das mulheres no meio rural. As experiências mostraram que políticas públicas eficazes exigem territorialidade, gênero e participação popular (CONTAG, 2013).

Nesse contexto, a CONTAG ampliou sua capacidade política, não apenas no Brasil, mas também em articulações internacionais como o COPROFAM (Coordenação de Organizações de Produtores Familiares do Mercosul) e a Reunião Especializada da Agricultura Familiar do Mercosul (REAF).

Ao mesmo tempo, a CONTAG manteve sua estrutura baseada nas federações estaduais (FETAGs), fortalecendo sua presença em todos os estados da federação e apoiando sindicatos em processos de legalização, formação política e controle social. Essa atuação combinou mobilização territorial, formação de base e institucionalização democrática, o que caracteriza, segundo Gohn (2011), um dos modelos mais consistentes de “movimento sociopolítico de base sindical” da América Latina.

5. Golpe de 2016, desmontes e ameaças aos direitos (2016–2023)

O golpe parlamentar de 2016, que resultou na destituição da presidenta Dilma Rousseff, inaugurou um período de retrocessos nas políticas públicas voltadas ao campo e intensificou a ofensiva contra os direitos historicamente conquistados pelos trabalhadores e trabalhadoras rurais. A extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), a paralisação de programas como o P1MC, o fechamento de conselhos participativos e a reforma trabalhista de 2017 sinalizaram um projeto de desmonte da estrutura de participação e das garantias sociais construídas desde a Constituição de 1988.

A CONTAG denunciou, desde o início, os impactos dessa agenda de austeridade e desregulamentação. Além das perdas diretas, como o fim de políticas específicas para a agricultura familiar, houve um enfraquecimento institucional das federações estaduais e dos sindicatos de base, afetados pela crise econômica e pela extinção da contribuição sindical obrigatória. Como analisa Medeiros (2020), “as organizações sindicais no campo enfrentaram, simultaneamente, a asfixia financeira, a criminalização política e a ofensiva ideológica contra os direitos sociais”.

Durante o governo de Jair Bolsonaro (2019–2022), esse processo se agravou com a militarização da política agrária, a paralisação da reforma agrária e a repressão aos movimentos do campo. O Estado se ausentou da coordenação de políticas de segurança alimentar no Semiárido, e iniciativas como as cisternas escolares ou os quintais produtivos foram abandonadas. Em muitos territórios, sindicatos rurais denunciaram o avanço do agronegócio sobre terras públicas e áreas de uso comum, com o aumento da violência, da grilagem e da destruição de bens comuns (Sauer & Almeida, 2021).

A CONTAG se viu obrigada a reorganizar sua estratégia, fortalecendo articulações com organizações da sociedade civil como a Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), o Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social e articulações internacionais de luta contra a fome e a pobreza. Esse foi um período de resistência, denúncia e tentativa de sobrevivência institucional diante do avanço autoritário e ultraliberal do Estado.

6. Retomada democrática e desafios contemporâneos (2023–2025)

A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva em 2022 representou uma inflexão política significativa para reafirmação dos movimentos do campo. A retomada do Ministério do Desenvolvimento Agrário, a reativação do CONSEA e do CONDRAF e a reinstitucionalização do Programa Cisternas sinalizaram a reconstrução de espaços democráticos de interlocução com o Estado e retomadas das políticas públicas voltadas para a agricultura familiar e para os segmentos empobrecidos da sociedade.

A CONTAG retomou sua posição nos conselhos nacionais e voltou a participar de fóruns internacionais, reafirmando sua defesa dos princípios da reforma agrária, da agroecologia, da convivência com o Semiárido e da valorização das juventudes e mulheres rurais. Ao mesmo tempo, enfrenta desafios estruturais, como a necessidade de renovar sua base sindical, recuperar sua capacidade formativa e reconectar-se com as novas pautas do mundo rural, como as mudanças climáticas, a transição energética e os direitos territoriais.

Segundo Leite (2023), “a reconstrução democrática exige o reconhecimento do papel histórico do sindicalismo do campo, não apenas como defensor de direitos trabalhistas, mas como ator estratégico na construção de um modelo de desenvolvimento rural sustentável e participativo”.

Programas como o novo PAC das Águas, o relançamento da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO), o fortalecimento das políticas de sementes crioulas e dos quintais produtivos recolocam a CONTAG como parceira fundamental na execução descentralizada e territorializada das políticas públicas. Nesse contexto, a articulação com as FETAGs e os Sindicatos de Trabalhadores Rurais STR’s é central para garantir que as ações de governo tenham capilaridade e legitimidade social.

Contudo, os riscos não estão superados. O avanço do neoconservadorismo, as disputas por orçamento e as limitações institucionais do Estado exigem, do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais - MSTTR, articulado nacionalmente pela CONTAG, um esforço contínuo de mobilização, formação e unidade política. Defender a CONTAG, neste novo ciclo, é também defender a democracia, os territórios e os bens comuns.

Considerações Finais

A história da CONTAG expressa, de forma exemplar, as disputas por projeto de sociedade no Brasil rural. Em seis décadas, a Confederação passou da resistência à ditadura à institucionalização democrática; da exclusão do campo às políticas públicas de convivência com o Semiárido; da repressão e violência à reforma agrária; da agricultura ecologicamente insustentável à luta por agroecologia, da agricultura degradadora à práticas agrícolas sustentáveis.

Sua trajetória mostra que os direitos conquistados pelas trabalhadoras e trabalhadores rurais foram resultado de organização, formação política, alianças estratégicas e protagonismo social e político. Como destaca Navarro (2003), “não há políticas públicas no campo que não tenham sido conquistadas e disputadas por sujeitos organizados, com voz e projeto político próprio” (p. 59).

Em tempos de incerteza e transição, é preciso reconhecer que a existência da CONTAG é uma condição para a própria existência da democracia rural. Ela representa não apenas uma estrutura sindical, mas um legado de luta, uma escola de cidadania e um espaço de construção coletiva de alternativas para o Brasil rural.

 Referências Bibliográficas

ASA Brasil. (2014). Programa Um Milhão de Cisternas: Relatório de Impacto. Recife: ASA.

CONTAG. (2013). Caderno das Margaridas: Políticas públicas e igualdade no campo. Brasília: CONTAG.

Delgado, G. C. (2012). Do capital financeiro na agricultura à economia do agronegócio. Campinas: Editora da Unicamp.

Fernandes, B. M. (2013). A formação do MST no Brasil. Petrópolis: Vozes.

Gohn, M. G. (2011). Movimentos sociais e políticas públicas. São Paulo: Cortez.

Leite, S. P. (2023). Democracia rural e participação: desafios contemporâneos. Revista de Estudos Rurais, 11(2), 31–49.

Medeiros, L. (2020). Crise sindical no campo: resistência e alternativas. Revista Crítica Rural, 5(1), 12–27.

Navarro, Z. (2003). Mobilização social e participação no Brasil rural. Estudos Sociedade e Agricultura, 1(21), 41–63.

Sauer, S. (2016). Agricultura familiar e políticas públicas: avanços e limites no ciclo progressista. In: R. Mendes & J. Rocha (Orgs.), Políticas Públicas e Sociedade Rural. Brasília: IPEA.

Sauer, S., & Almeida, L. C. (2021). Terra e poder: conflitos fundiários e autoritarismo no Brasil. São Paulo: Expressão Popular.

Silva, R. L. (2010). Formação política e sindical no campo: a experiência da ENFOC. Brasília: CONTAG.

*Antonio Gomes Barbosa. Sociólogo, mestre em agroecologia e doutorando em gestão sustentável de recursos naturais pela Universidade de Córdova, Espanha. Coordenador de programas de acesso à água para produção e sementes crioulas pela Articulação Semiárido Brasileiro – ASA.

** Alexandre Ribeiro Botelho – Merrem. Educador popular, filósofo, bacharel em direito e mestre em Agroecologia. Colaborador na formação de trabalhadores e trabalhadoras rurais na Escola Nacional de formação da CONTAG - ENFOC e facilita processos  participativos para construção de políticas públicas.

EMBRIÕES DA EXTENSÃO RURAL DE BASE AGROECOLÓGICA NO PIAUÍ: A TRAJETÓRIA DO CEPAC (2023)

Antonio Gomes Barbosa*

 RESUMO

Este artigo é inspirado em parte do trabalho monográfico intitulado “Encontros e desencontros com a Extensão Rural – estudo de caso sobre a trajetória extensionista do Centro Piauiense de Ação Cultural - CEPAC” submetido à Universidade de Brasília- UNB, em junho de 2005, compondo a Especialização em Extensão Rural para o Desenvolvimento Sustentável da UNB.

Aqui se destaca brevemente a trajetória de uma das organizações pioneiras na abordagem agroecológica no Piauí, O CEPAC, os caminhos percorridos desde sua ação sindical urbana militante, até sua chegada na zona rural do Estado enquanto ação de assessoria junto à agricultura familiar, ação extensionista, seus encontros e desencontros na construção de alguns dos embriões que inspiraram a extensão rural de base agroecológica no Piauí

 O Centro Piauiense de Ação Cultural - CEPAC surge no final da década de 1970 e início da década 1980 em uma conjuntura adversa. A ditadura militar ainda respirava. Porém, a crise social e econômica vivenciada no país questiona cada vez mais o modelo e a legitimidade do governo militar. Os movimentos sociais, partidos clandestinos, organizações populares, intelectuais, artistas, jornalistas, trabalhadores rurais, favelados, etc, aproveitam o momento de efervescência, ganham legitimidade e começam a desenhar as primeiras linhas e estratégias para a construção de uma nova sociedade.

Segundo Medeiros (1984), no Piauí, este sentimento materializou-se no fortalecimento dos movimentos de professores das redes pública e privada, favelados, moradores de conjuntos da COHAB, trabalhadores rurais, estudantes, donas de casa. Ressalte-se que maior parcela destes movimentos concentrava-se na capital, Teresina. No interior, os movimentos de trabalhadores rurais ganham destaque no cenário estadual a partir da vitória de oposições sindicais, conflitos pela posse de terras, movimento de mulheres pela extração de babaçu, surgimento de bancos de sementes e das Associações Comunitárias de Produção e Consumo (ACPC). Estas iniciativas, partindo de organizações espontâneas e/ou institucionais, demandavam profissionais qualificados em nível local.

Estes dois componentes, conjuntura favorável e necessidade por profissionais qualificados, fizeram nascer, em outubro de 1980, no Piauí, mais precisamente em Teresina, a ideia de um centro de apoio aos movimentos populares. À época, apenas a Comissão Pastoral da Terra (CPT) assumia a tarefa de assessoria política, contava-se também com algumas iniciativas da diocese de Picos, que estava iniciando, e das paróquias da cidade de Esperantina e a do Parque Piauí, bairro de Teresina.

A primeira ação da equipe do CEPAC foi elaborar um projeto e encaminhá-lo ao Movimento dos Leigos da América Latina - MLAL. A proposta foi considerada “audaciosa” pela agência e não conseguiu aprovação. Segundo Bonfim (1985), o sonho era prestar assessoria aos movimentos sociais de bairros, sindicatos e grupos de oposição sindical, oferecendo serviços de formação, assessoria jurídica e mecanografia. Embora sem recurso institucional, foram realizadas algumas atividades de formação. A primeira foi um curso sobre “Sindicalismo”, em junho de 1981, que contou com a participação de 15 pessoas, sendo ministrado por dois assessores, sendo um do Centro de Ação Comunitária - CEDAC (São Paulo), e outro da CAPPS (Rio de Janeiro).

Na oportunidade, esses assessores, também, ajudaram a rediscutir o projeto inicial, sugerindo algumas alterações. Além disso, o CEDAC encaminhou o projeto para Ação Quaresmal Suíça - FASTENOPFER, e em [fevereiro-abril] de 1982 a mesma liberou um recurso a título de urgência de 7.500,00 francos suíços, equivalentes, à época, a 3.827,00 dólares. Com este recurso foi possível comprar equipamentos e realizar várias atividades: cursos sobre sindicalismo urbano, autonomia popular e solo urbano, sindicalismo rural, sindicalismo pra mulheres, teologia da libertação; seminários sobre educação popular, seminário regional sobre solo urbano, seminário sobre saúde popular, encontros sobre fé e política e encontros com intuito de organizar a Central Única dos Trabalhadores – CUT, além das atividades de assessoria sindical urbana e rural.

Em 20 de maio de 1982 o CEPAC nasce oficialmente. Por ainda se tratar de um período de repressão, o primeiro desafio foi encontrar um nome que evitasse patrulhamentos ou restrições burocráticas e políticas, e por conveniência, adotou-se CENTRO PIAUIENSE DE AÇÃO CULTURAL. Protegido pelo codinome cultural, o CEPAC organizou-se para prestar um serviço à época revolucionário: contribuir para a formação de um movimento social crítico, contestador e que lutasse por conquistas de direitos no Piauí, reforçando a luta pelo fim do regime autoritário brasileiro.

Para atingir seus objetivos, o CEPAC dividiu suas atividades em equipes específicas, a saber: Sindicalismo Rural, Sindicalismo Urbano, Periferia Urbana, Comunicação e Documentação, propondo-se a engendrar, em linhas gerais, as ações de:  estudos e pesquisas;  capacitação de pessoal; assessoria técnica na elaboração e execução de projetos comunitários; edição de textos e outros materiais; assessoria jurídica; intercâmbio com entidades afins (Art. nº 20 do Estatuto do CEPAC).

Mesmo sendo prioridade o meio rural, a necessidade por transformações mais profundas no Estado, exigia do CEPAC ações que pudessem fortalecer resistências sociais em outros setores. Eram crescentes as demandas em Teresina, porém, o grau de organização da sociedade civil era baixo. O CEPAC tenta atuar em todas as áreas do movimento popular rural e urbano: movimento de mulheres, negros, sindicalistas, associações de bairros e até uma tentativa de alfabetização de adultos.

Na contramão, entre o desejo e a necessidade, o CEPAC convivia com um fator limitante, um pequeno número de profissionais para tanta demanda. Quem atuava no CEPAC era voluntário e trabalhava em outros locais, maioria em instituições do Estado, podendo dedicar apenas os finais de semana e horas vagas, inclusive as noites. Este fator foi fazendo os setores urbanos ganharem maior importância na atuação do Centro.

O primeiro momento de reflexão da equipe técnica sobre sua atuação, teve como ponto de partida o texto “Primeira meditação cepaqueana – CEPAC 83: Deslancha ou diz porque não deslancha”, elaborado pelo professor Antônio José Castelo Branco Medeiros, um dos idealizadores do Centro. A relevância deste documento que embasou a primeira avaliação da equipe do CEPAC é a caracterização dos grupos e movimentos populares existentes no Estado. Os principais pontos abordados podem ser divididos em três categorias: “grupos residenciais”: caracterizados como movimentos difusos e espontâneos, existente nas favelas, periferias urbanas, nos conjuntos habitacionais e nas cidades de médio porte; “grupos especiais”: estudantes universitários e secundaristas, os artistas, os movimentos de mulheres, de homossexuais, os ecologistas e outros; e os “movimentos populares de categorias profissionais”: considerados fundamentais para as mudanças sociais mais profundas, porém apresentando como limite o conformismo e existência de direções “pelegas” nos sindicatos, foram consideradas três condições básicas: i) nível de organização da categoria; ii) participação em lutas; e iii) a participação de lideranças que emergiam, podendo assumir posições estratégicas.

Nesta última categoria foram incluídos os trabalhadores rurais e caracterizados como movimento popular, rede com nível razoável de organização e ocupantes de posição especial:

Os trabalhadores rurais ocupam uma posição especial. É o MP de maior amplitude quantitativa. Possui uma grande rede organizativa. Conseguem um nível razoável de mobilização, variável conforme os sindicatos. Como a categoria é numerosa, mesmo uma mobilização relativa, em termos absolutos (MEDEIROS, A. J, 1984)

Mesmo considerando a forte influência marxista que norteou o surgimento do CEPAC, o documento não envereda para os debates existentes sobre o futuro e as características do campesinato nas sociedades capitalistas ou semi-capitalistas. Trabalhadores urbanos e trabalhadores rurais são separados apenas por espaços de atuação, destacando apenas a quantidade numérica da segunda.

O documento discorre sobre as ações dos sindicatos, identificando-as como ações meramente assistencialistas, os serviços oferecidos de assessoria jurídica aparecem como positivos, apesar de caracterizados como de pouca ação coletiva, tratando na maioria das vezes apenas de questões pessoais e isoladas. Por outro lado, nas questões de conflitos pela posse da terra, os serviços jurídicos ganharam destaque, e a CPT teve papel relevante no Estado.

Numa outra frente, deu-se início a um processo de descentralização das atividades através do incentivo a construção de novos centros de formação. Como primeiro resultado, no ano de 1984, a partir do trabalho da paróquia de Esperantina foi fundado o Centro de Educação Popular Esperantinense - CEPES. O mesmo passou a assessorar os movimentos da cidade e do campo dos municípios do entorno a Esperantina. O surgimento do CEPES possibilitou a divisão do trabalho na região, permitindo ao CEPAC tempo para produzir várias apostilas que foram sendo usadas nos cursos de formação sindical.

Ampliando as ações em parceria e também fazendo parte da estratégia de aproximação com a FETAG, o CEPAC apóia o 4º Congresso de Trabalhadores Rurais no Estado do Piauí. No intuito de consolidar um bloco que atuasse para desenvolver algum tipo de trabalho metodológico para apoio aos movimentos populares, surgiu a chamada “Articulação com Entidades” (CEPAC, CPT, CEPES e Movimento de Educação de Base - MEB, etc), que começaram a pensar atividades na linha da formação teórica e política. Estas atividades possibilitaram a reflexão sobre qual deveria ser a função de um centro de assessoria popular.

Estas reflexões ajudaram o CEPAC, em 1985, a eleger quatro princípios norteadores para sua ação, i) assumir como papel principal a assessoria indireta, combinado com o acompanhamento, que o CEPAC denominava de assessoria direta; ii) favorecer a constituição de fóruns próprios dos movimentos populares, garantindo-lhes autonomia; iii) assumir o trabalho em parceria com outras entidades, ou seja, assumir a dupla articulação com movimentos que tinham a mesma opção metodológica; e iv) incentivar a regionalização do trabalho de assessoria popular para evitar a concentração das ações, multiplicando os trabalhos e garantir proximidade com as bases. Na tentativa de sedimentar estes princípios, o CEPAC optou pela profissionalização de alguns militantes.

No meio rural vários conflitos resultaram na conquista da terra, a exemplo do que acontecera nas comunidades Barreiro do Otávio e povoado Cabeceiras, município de Barras. As mulheres quebradeiras de coco babaçu mobilizavam-se pelo direito a extração e comercialização dos produtos dos babaçuais.

A imprensa começava a notificar os fatos políticos envolvendo as lutas sindicais e movimentos na periferia urbana identificando os principais conflitos e suas lideranças. Neste período, o CEPAC em conjunto com a CPT e o Centro de Estudos Alternativos – CEA, lançam o jornal popular “Alternativa”, que passa vincular matérias com as informações das várias categorias profissionais e movimentos populares. Havia um embrião da ação em rede em curso e as ações passavam a ganhar consistência social.

Ao final de 1986, fora possível fazer o seguinte balanço: conquista de 12 Sindicatos de Trabalhadores Rurais; vitória das oposições sindicais no Sindicato dos Comerciários, Sindicato dos Jornalistas, Sindicato dos Motoristas, Sindicato dos Gráficos e Sindicato dos Vigilantes; criação do Sindicato das Assistentes Sociais e do Sindicato das Enfermeiras de nível médio; greve de motoristas, greve dos comerciários, greve dos gráficos; greve de jornalistas, greve de vigilantes, greve de enfermeiras; criação da CUT; regulamentação de jornadas e condições de trabalho e estabelecimento dos primeiros pisos salariais no Estado.

No início da década de 1980, as pessoas que trabalhavam no CEPAC e nas ONGs eram quase todas educadoras populares (historiadores, sociólogos, assistentes sociais, padres, freiras, etc), preparadas para o trabalho político-organizativo. Esta condição refletia a concepção que se tinham de assessoria política, em que as questões organizativas eram prioritárias.

 Com o passar dos anos, o trabalho na área rural do CEPAC encontrou-se com os efeitos da forte estiagem que abateu o nordeste brasileiro (1979-83). Não contando com profissionais da área produtiva (agronomia, técnicos agrícolas, veterinária, os afins), que pudessem prestar uma assessoria técnico-produtiva aos pequenos agricultores, o CEPAC não conseguia responder as demandas desta natureza, oriundas de projetos comunitários dos pequenos agricultores e de suas necessidades diárias.

Entre as várias estratégias de defesas construídas pelas comunidades no meio rural, no Piauí estava a constituição das Associações Comunitárias de Produção e Consumo – ACPC e os bancos comunitários de sementes. Para o CEPAC é o momento de perceber que os trabalhadores rurais precisavam ser identificados também como agricultores. Por sua vez, estes passam a cobrar cada vez mais do Centro um acompanhamento que pudesse garantir os aspectos técnico produtivos.

 Esta conjuntura levou o CEPAC a contratar agrônomos e técnicos agrícolas, técnicos da área de produção rural, que em contato com os técnicos da área social, possibilitaram novas percepções e formulações sobre o meio rural e as pessoas que ali vivem. Neste momento pode-se falar numa releitura das questões técnicas e político organizacional do universo histórico-cultural das comunidades para o CEPAC. Esta situação é muito mais uma imposição da conjuntura do que uma deliberação da entidade, colocando o CEPAC no caminho da extensão rural e posteriormente no caminho da agroecologia.

Isso ocorreu no meio de uma crise de estratégia, que, por um lado priorizava as ações sindicais e os sindicatos, vendo as associações de pequenos produtores com maus olhos pelo “risco” de desviar o foco da ação e tomar parte do tempo que deveria ser dedicado à luta sindical. Teoria que não se sustentou e, coincidentemente ou não, nas fases posteriores do trabalho rural, o Centro elege o trabalho com as associações como uma das suas principais estratégias.

A necessidade de conseguir sementes para o plantio fez com que as Associações de Bancos de Sementes se proliferassem nos municípios. A estiagem havia levado as famílias a perderem suas sementes, além do que os bancos de sementes eram uma estratégia que resgatava uma prática ancestral, armazenar sementes para os períodos de crise. As Associações de Banco de Sementes foram potencializadas pela política emergencial de distribuição de sementes, campanha realizada em todo nordeste, pela  Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, após o período de estiagem (1979-83). Desta campanha no Piauí participaram: FETAG, CPT, alguns STRs e o CEPAC, que ficou responsável pela distribuição de sementes em cinco (05) municípios. 

[...] partiu-se da ideia do Banco de Semente pra uma ideia mais duradoura de constituir dali uma Associação de Produção que teria como berço à garantia de nunca mais faltar sementes, porque eles desenvolveriam a semente no caso, pra associação, a associação guardaria e no ano seguinte, teria, e a partir daí, na medida do possível, ampliando o raio de ação dessa associação (NOGUEIRA, M. S, grifo nosso)

Percebe-se, então, que a reorientação do trabalho do CEPAC em campo está diretamente relacionada com o surgimento das Associações de Bancos de Sementes. O CEPAC foi sendo levado a contribuir com a constituição destas associações sem ter refletido internamente qual o papel deste tipo de organização. Esta ação, vista como espontaneísta,  foi duramente criticada internamente.

Agora no caso de União a ideia veio em pouco de lá, de querer uma associação e eles fizeram pra que a gente fizesse o projeto; fizeram o pedido pra que a gente fizesse o Estatuto e a gente foi fazendo, ai hoje está lá a Associação legalizada. Tanta gente achou problemática a idéia de fazer esta Associação de uma hora pra outra, que nós não incentivamos em outros lugares (NOGUEIRA. 1985, grifo nosso).

Forçado a apoiar a fundação da Associação de Consumo e Produção Comunitária do município de União, o Centro foi internamente criando uma resistência na constituição de novas associações. Esta resistência não conseguiu evitar que outras associações fossem constituídas em outros municípios assessorados pela entidade. Caso emblemático aconteceu no município de Campo Maior, aonde o CEPAC tentou desestimular a iniciativa das comunidades.

Lá em Campo Maior o pessoal queria fazer e nós chegamos lá e resolvemos foi desestimular, aconselhar a esperar mais pra saber o que é que é isso, (...) O pessoal de já queria fundar, inclusive eu fui, cheguei lá, já estavam esperando dizendo que era, que já era pra eu levar o Estatuto; eu digo: rapaz, é assim com essa pressa toda! (NOGUEIRA, 1985)

A partir do ano 1986, cresce a demanda ao CEPAC por apoio técnico, administrativo e institucional a projetos que trouxessem ganhos efetivos na renda e melhoria no nível de vida. Estas iniciativas estavam sempre sob o controle dos próprios grupos de trabalhadores e relacionados com o trabalho educativo.

Mesmo não tendo uma resolução clara sobre qual a melhor estratégia a adotar em campo, o apoio a projetos econômicos alternativos foi levando o CEPAC a mudar sua visão em relação à problemática rural[6].

Um grande marco foi no ano de 1993, o CEPAC realizou um seminário para definir sua linha de ação no meio rural. Este seminário foi assessorado por Silvio Gomes da AS-PTA, que fez o CEPAC aproximar-se da Rede de Projeto de Tecnologias Alternativas – Rede PTA. Como resultado, o Centro elegeu como área prioritária o município de Campo Maior- Piauí [7], abandonando definitivamente o trabalho de assessoria sindical como centro.

Depois da realização de um Diagnóstico Rápido Participativo de Agroecossistemas – DRPA, foram priorizados os trabalhos com tecnologias alternativas de produção, a partir das unidades demonstrativas - UDs, unidades de transferência tecnológicas de caprinos – UTTs. O CEPAC passa de vez para o trabalho na extensão rural com base agroecológica.

Ao longo de dez anos, o CEPAC apostou na difusão de tecnologias alternativas de produção, casando esta política com a assessoria as associações de pequenos agricultores. Um misto de assessoria direta (acompanhamento) com assessoria indireta. Para difundir estas tecnologias, na qualidade de mediadores do conhecimento, o CEPAC elegeu alguns agricultores, denominados de Agricultores Multiplicadores.

Indiscutivelmente, de longe, este foi o trabalho mais consistente do Centro na área rural. O uso das tecnologias alternativas permitia uma maior produtividade de grãos, processos de adubação de solos e novas formas de preparo das áreas. Surgiram os roçados permanentes. Estas técnicas foram sendo paulatinamente difundidas pelos agricultores multiplicadores a partir dos dias de campo e das visitas às UDs e UTTs.

A segunda metade dos anos 1990 vai trazer para o meio rural um conjunto de demandas e políticas públicas, muitas vão contribuir para o incipiente trabalho de assessoria agroecológica, entre as quais vale destacar o surgimento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF (1996), o projeto LUMIAR (1997) e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária - PRONERA (1998).

Ao final dos anos 1990, dados os constantes efeitos das secas e o total descaso dos seguidos governos, surge no rural nordestino uma rede de organizações com foco nas ações de convivência com o Semiárido, agroecologia aplicada à região. A Articulação Semiárido Brasileiro (ASA). No Piauí a ASA se materializa no Fórum Piauiense de Convivência com o Semiárido. Com a ASA, surge também o Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC). Neste período o CEPAC vinha desenvolvendo seu trabalho de assessoria agroecológica mais focado no município de Sigefredo Pacheco.

Em 2002, durante a realização do primeiro Encontro Nacional de Agroecologia (ENA), na cidade do Rio de Janeiro, o CEPAC organiza uma pequena delegação composta por técnicos de suas equipes internas e alguns agricultores de comunidades em Sigefredo Pacheco assessoradas pela entidade.

Em uma nova reorganização das estratégias do CEPAC, já tendo a clareza que a agroecologia deveria ser sua principal estratégia de atuação no campo, em 2004, o CEPAC passa a integrar a comissão organizadora do Encontro Nacional da ASA (V ENCONASA), realizado em Teresina, em novembro do mesmo ano. Ainda em 2004, passa a integrar a Rede de Assessoria Técnica e Extensão Rural do Nordeste (Rede ATER/NE), que congregava treze ONGs de quatro Estados: Pernambuco (Centro Sabiá, Caatinga, Diaconia e Assocene),  Bahia (MOC, Apaeb, Ascoob e  Sasop); Paraíba (AS-PTA e Patac); Ceará (Esplar e Cetra) e Piauí (CEPAC). A Rede ATER/NE surgiu a partir do processo que se abriu com o diálogo sobre a nova política nacional de ATER, coordenada no Ministério de Desenvolvimento Agrário – MDA, pelo Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural – DATER. Na rede ATER/NE se tinha muito claro que a construção da agroecologia no Semiárido e no Nordeste passava necessariamente por dentro da ASA, e que era necessário construir um programa agroecológico para apoiar as famílias agricultoras e fortalecer as experiências nos territórios. Era preciso ganhar mais organizações e pessoas para a pauta agroecológica. A partir do final de 2004, o CEPAC passa a integrar a coordenação executiva da ASA, e na ASA, passa a compor à coordenação nacional da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).

De 27 a 29 de abril de 2006, com mais de 130 pessoas, de todas as regiões do estado, o Piauí realiza o primeiro Encontro Estadual de Agroecologia (EPA), ação coordenada pelo Fórum Piauiense de Convivência com o Semiárido, pela Via Campesina e pela Coordenação Estadual de Comunidades Negras do Piauí. O EPA foi preparatório ao II ENA que aconteceu de 02 a 6 de junho de 2016 na cidade de Recife. O Piauí participou do II ENA com 60 delegados e delegadas, 2/3 de agricultores e agricultoras.

Nessa trajetória do CEPAC, saiu da conceituação de trabalhadores rurais, sujeitos coletivos capazes de fazer mudanças sociais a partir da ação sindical, para o conceito de agricultores familiares, sujeitos de necessidades e sentimentos. Propôs-se  discutir a extensão rural a partir da observação, do diálogo e da compreensão do que é a agricultura familiar e com foco na agroecologia. Partindo do pressuposto que é preciso aprender com a própria agricultura familiar, compreender suas dinâmicas, processos de diálogo, trocas e complementaridades, estabelecendo uma lógica sistêmica da produção familiar.

Na lógica convencional da extensão rural, o crédito e a assistência técnica eram centrais ao desenvolvimento, atrelados diretamente a um subsistema, geralmente utilizados na potencialização de monoculturas, condenando a agricultura familiar a forte endividamento. Na contra mão das políticas de crédito e da assistência técnica oficial, a nova extensão rural proposta exigia trabalho orientado pela observação das dinâmicas dos sistemas produtivos da agricultura familiar, que trocam insumos e energias entre seus subsistemas e se relacionam com outros sistemas no entorno.

Construir uma nova extensão rural significaria construir novos valores, novas formas de ver o mundo: sem transformação do individuo coletivo não há transformação coletiva. Era preciso reconhecer erros históricos e querer mudá-los. Na ação do CEPAC, durante muito tempo foram trabalhadas as tecnologias alternativas e priorizados subsistemas produtivos, quase sempre os roçados, a criação de pequenos animais e os quintais. Embora esta ação desenvolvida tenha sido importante, não podia ser chamada de ação agroecológica, no máximo, de “boa vontade” agroecológica.

 Prova disto, é que o longo tempo de trabalho nas Unidades Demosntrativas - UDs e nas Unidades de Transferência de Tecnologias - UTTs de Caprinos não conseguiram potencializar a independência dos sistemas produtivos das famílias acompanhadas. Ao contrário, estas passaram cada vez mais a necessitar da ação do Centro para conseguir insumos, a exemplo do bagaço da palha de carnaúba.

Na verdade, a ação que se propunha ser agroecológica era bem pontual, centrada em experiências difundidas pelos agricultores multiplicadores e esporadicamente nos dias de campo, talvez por isso, é que apesar de conseguir difundir técnicas agroecológicas, não avançou no processo de transição agroecológica dos sistemas produtivos.

Para traçar a “nova extensão rural” era preciso identificar rumos, conhecer os agricultores e agricultoras e suas formas de organização, sua dinâmica, sua lógica, seus valores, suas experiências, sua história e, porque não, suas pretensões. Era imprescindível  reconhecer que agricultoras e agricultores têm experiências acumuladas, embora não sistematizadas. Era preciso reconhecer a importância de tais experiências para iniciar qualquer diálogo. Este reconhecimento e valorização não poderiam ser artificiais, o/a extensionista precisaria estar convencido desta premissa.

Aquele era um bom exercício para construção coletiva de conhecimentos agroecológicos entre extensionistas e agricultoras e agricultores familiares. Não era um passo fácil de se transpor, requeria dedicação, qualificação das equipes técnicas, estudos, pesquisas, reflexões e elaborações sobre a produção de saberes. O resultado daqueles diálogos deveriam ser materializados em elaboração teórica, sistematização, publicação de trabalhos e pesquisas participantes.

O conhecimento agroecológico não poderia concentrar todos os seus esforços no estudo das práticas de produção. Estas foram importantes e ajudaram na compreensão dos sistemas produtivos, porém era preciso valorizar outras dimensões da vida em comunidade, possibilitando o resgate de conhecimentos usurpados e transformados em mercadorias. Iniciar o processo de construção do conhecimento agroecológico não poderia ser algo abstrato, deveria partir de algo concreto, nos sistemas produtivos. O processo deveria se concretizar a partir da transição agroecológica, discutida, percebida e construída nas dimensões do desenvolvimento sustentável.

Estabelecer uma nova forma de acompanhamento técnico, compreender a agricultura familiar e consolidar um diálogo entre o conhecimento técnico e os conhecimentos tradicionais dos agricultores, eram o principal desafio da “nova extensão rural” ali proposta.

A tarefa posta para a extensão rural naquela conjuntura era a de compreender a agroecologia como proposta de desenvolvimento sustentável, partindo da análise dos sistemas produtivos e suas inter-relações, trabalhando a transição agroecológica como processo, potencializado pelas experiências de convivência com os ecossistemas.

Era oferecer acompanhamento técnico e oportunizar intercâmbios entre agricultores e as outras áreas do conhecimento, possibilitando capacitações e sistematização de experiências no fortalecimento de uma rede que tenha como centro os agricultores. Aquele momento era a oportunidade de participar da construção e consolidação de um projeto de desenvolvimento sustentável que prioriza o saber, a produção, e antes de tudo, prioriza as pessoas.

O esboço do projeto estratégico do programa de Desenvolvimento Rural Sustentável no CEPAC foi fundamentado nos aprendizados das várias etapas vivenciadas, sendo reflexo de processos e transformações, debates pautados em análise de conjuntura, opções políticas, escolha de métodos e técnicas, estudos de viabilidade, necessidades locais, regionais, nacionais e até da redefinição de linhas de ação de entidades da cooperação internacional.

Em muitos momentos, o CEPAC afastou-se do debate, reflexo de crises internas, trocas constantes de equipes e pouca clareza sobre qual a estratégia que a entidade deveria adotar no meio rural. Sem a clareza institucional necessária, as equipes foram construindo seus dilemas e alternativas e soluções, o que possibilitou erros e acertos, sobretudo, interrogações, que se estenderam até o encerramento de suas atividades.

Muitas vezes definir a estratégia não significa sua implantação na prática. Fatores como falta de recursos, demandas e dinâmicas do dia a dia em campo, processos de internalização da proposta pelas equipes, riscos da estratégia virar pacotes de caráter alternativo, dentre outros, refletem fragilidades, equívocos, resultados inesperados.

A agroecologia na agricultura familiar apresenta-se com o caminho para a construção desta nova extensão rural. Partir das indagações deve ajudar a extensão rural a construir respostas e formular muitos outros questionamentos relativos à sua prática cotidiana. Esse é o dilema de várias outras organizações de ATER ainda nos dias atuais.

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 *Antonio Gomes Barbosa, sociólogo, especialista em extensão para o desenvolvimento sustentável, mestre em agroecologia e doutorando em agroecologia pela Universidade de Córdoba, Espanha. Pela Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), é coordenador do projeto DAKI – Semiparido Vivo, ação focada na sistematização de experiências e formação em agricultura resiliente ao clima que envolve as regiões semiáridas do Corredor Seco da América Central, do Chaco na América do Sul e do Semiárido Brasileiro; Pela ASA coordenou o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2) e o Programa Sementes do Semiárido. Foi assessor de política agrária e meio ambiente da Federação dos trabalhadores na Agricultura do Piaui (FETAG-PI) no ano de 1997 e integrou a equipe do CEPAC nos anos de 2001 a 2007. barbosa.pi@gmail.com

[1] CEPAC, 1995 – Relatório de Atividades.

 [2] Segundo Abramovay (1998), apesar de Marx não ter elaborado uma construção mais acabada em torno da questão agrária, apresenta que, no corpo das categorias que constituem as leis do capitalismo, o campesinato não possui lugar definido. Isso por que, se ao camponês fosse atribuído lucro, seria uma capitalista, e se recebesse salário, seria um operário. Vivendo da renda da terra, o camponês seria então um proprietário fundiário, que só emergiria como a “terceira” classe na medida em que esse rendimento fosse originário da mais valia social. A impossibilidade de definir claramente a natureza e a origem dos rendimentos demonstra que o conceito de camponês em “O Capital” é impossível. A atividade produtiva que dá origem à sua reprodução não tem o estatuto de trabalho social.

 [3]           CEPAC - Memória HISTÓRICA - versão Preliminar, 1989.

 [4] FONSECA, Graziani. Políticas governamentais e seus efeitos sobre a estrutura agrária no Piauí, 1993.

 [5] A partir do final da grande seca (1979-83), grupos de trabalhadores rurais começaram a organizar as Associações Comunitárias de Produção e Consumo – ACPC.

[6] CEPAC, Memória histórica (Versão Preliminar).

[7] E posteriormente, com a emancipação, o município de Sigefredo Pacheco- Piauí.

PREFÁCIO - Superação da pobreza rural no Semiárido brasileiro: a trajetória do Projeto Dom Hélder Câmara

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